OPERAÇÃO ENTRE AMIGOS II

PF diz que ex-promotor está entre principais beneficiários de fraude que lesou prefeituras

Gilmar de Assis atuaria como lobista de organização criminosa que teria causado prejuízo aos municípios de Betim, Divinópolis e Ribeirão das Neves

Por Clarisse Souza
Publicado em 17 de dezembro de 2024 | 09:52
 
 
O esquema supostamente comandado pelo IBDS foi descoberto durante operação da PF em Divinópolis

Um ex-promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais é apontado pela Polícia Federal como lobista e um dos principais beneficiários de um suposto esquema criminoso que teria provocado rombo de ao menos R$ 27,5 milhões aos cofres de três prefeituras mineiras durante a pandemia. Citado 270 vezes no relatório final da Operação Entre Amigos II, Gilmar de Assis é suspeito de ter usado sua influência como ex-coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde (CAO-Saúde) para viabilizar, junto a administrações municipais, a contratação de uma organização social de fachada, que tinha como único objetivo desviar recursos públicos. As investigações indicam que o suspeito teria lucrado cerca de R$ 5,5 milhões com a participação nas fraudes. 

O delegado Felipe Baeta, responsável pelo caso, afirma “não restar nenhuma dúvida da participação de Gilmar de Assis no esquema”, fato que resultou no indiciamento do ex-promotor pelos crimes de organização criminosa, peculato (desvio de recursos públicos) e Embaraçar investigação de infração penal que envolva organização criminosa. 

Segundo o chefe da operação, a Polícia Federal reuniu provas documentais que deixam clara a atuação do ex-promotor como um articulador a serviço do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS). Essa entidade teria sido instituída de maneira fraudulenta, ainda em 2017, para entrar em concorrências públicas de maneira ilícita e seria a responsável por liderar a organização criminosa supostamente responsável por causar prejuízo ao erário de prefeituras mineiras.

“Restou apurado que Gilmar de Assis atuava, principalmente, como ‘lobista’ (responsável pelo tráfico de influência) do grupo criminoso, obtendo ilicitamente, a partir de poder de influência e ação política, contratos para o IBDS”, aponta trecho do relatório da Polícia Federal. Segundo o delegado Baeta, há indícios de que a atuação do ex-promotor tenha ajudado a quadrilha a se infiltrar nas prefeituras de Betim, Divinópolis e Ribeirão das Neves, onde o instituto teria, de maneira ilegal,  direcionado e superfaturado contratos de prestações de serviços em saúde, provocando rombo milionário aos cofres dos municípios durante a pandemia de Covid-19. Ainda segundo Baeta, embora tenha sido constatada a participação de servidores públicos na fraude, o inquérito aponta que administração direta dos municípios não tinha ciência da fraude e foi vítima dos criminosos. 

O delegado ressalta que o ex-promotor seria um dos responsáveis por indicar municípios que poderiam se tornar alvo da organização criminosa. “Ele atuava para viabilizar a contratação ilícita do IBDS, indo, inclusive, presencialmente às prefeituras”, detalha. 

Trocas de mensagens e provas documentais reunidas pela PF durante as investigações contêm várias evidências de que o promotor aposentado teria se comprometido a buscar a contratação do IBDS nos municípios mineiros em troca de dinheiro. Segundo relatório da PF, “o pagamento ilícito desses valores era feito através da própria contratação direcionada, indevida e irregular da pessoa jurídica de Gilmar em todos os contratos obtidos por ele”, por meio de uma empresa de fachada. 

Ainda conforme o inquérito, somente entre 2020 e 2021 (anos de pandemia), o promotor aposentado teria recebido cerca de R$ 5,5 milhões em transferências bancárias realizadas pelo IBDS. “Ele foi um dos que mais recebeu do instituto”, garante o delegado. A reportagem procurou o ex-promotor e o IBDS, mas até o fechamento desta edição eles não haviam se manifestado.

Questionado pela reportagem, Gilmar de Assis negou as acusações apresentadas pela Polícia Federal e disse, em nota encaminhada por seus advogados, que ainda aguarda para ser ouvido no processo.

Confira a íntegra da resposta apresentada por Gilmar de Assis:

Em relação ao relatório policial em questão, não são verdadeiras as gravíssimas imputações que vêm sendo feitas à pessoa de Gilmar de Assis, de forma pessoalizada, injusta e não profissional, sob a responsabilidade do Delegado Dr. Felipe Koch Torres Baeta. 

Essa investigação corre em segredo de Justiça, tendo Gilmar de Assis, através de seu advogado, ingressado com os devidos meios judiciais para seu acesso integral, para o exercício do seu direito de defesa, pendente de julgamento pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região, uma vez que a autoridade policial se negou, por várias vezes, a disponibilizar a apresentação integral da investigação, decidindo por apresentar seu relatório final. 

Gilmar de Assis não foi sequer ouvido no Inquérito Policial, portanto sem o exercício de seu direito de defesa, embora o Ministério Público Federal da SSJ de Belo Horizonte, por 03 vezes, expressamente tenha determinado que o fizesse.

Salienta-se que, a época dos fatos, a empresa privada de Gilmar de Assis foi contratada pelo IBDS, de natureza privada, para prestação de serviços de auditoria em saúde, pelo prazo de 03 meses, no valor mensal de R$ 15 mil reais, o que é distorcido pela autoridade policial em seu relatório de indiciamento.

Os serviços foram efetivamente prestados, entregues os respectivos relatórios e apresentadas as notas fiscais, com certidões de sua regularidade fiscal. Os trabalhos foram realizados no ano de 2020, logo após a Decretação da Emergência em Saúde Pública no Brasil, decorrente da Pandemia COVID-19.

O Município de Betim foi um dos primeiros a fazer a contratação emergencial (IBDS) para a estratégia de hospital de campanha, a fim de evitar que houvesse mortes sem precedentes, tal qual vinha ocorrendo pelo mundo.

Inclusive, essas acusações já foram refutadas pelo Ministério Público Federal (MPF) da SSJ de Divinópolis ao não aceitar o relatório de indiciamento lá feito. Gilmar de Assis não foi denunciado pelo MPF em Divinópolis.

Com relação aos fatos de Betim, o Ministério Público Federal (MPF) da SSJ de Belo Horizonte, mesmo à vista do relatório final do Inquérito elaborado pelo Delegado, determinou o prosseguimento das investigações para o seu necessário convencimento.

Não é verdade que Gilmar de Assis tenha “faturado R$ 5,5 milhões com fraudes na pandemia” , conforme diz a Polícia Federal. O que efetivamente recebeu por aquela prestação de serviços em Betim, repito, foi R$ 15 mil reais mensais, por 03 meses.

Já está sendo finalizada perícia contábil para ser juntada aos autos do procedimento, com demonstração inequívoca de que todos os recebimentos em sua conta bancária, nos anos de 2019 e 2020, se referem a proventos e honorários decorrente do exercício da Advocacia, cuja Sociedade de Advogados não é investigada.

Gilmar de Assis lamenta profundamente o propósito de atingimento de sua reputação pública construída por quase 40 anos de serviços prestados à sociedade, em Minas Gerais e no Brasil e acredita que a Justiça será restabelecida!