Na mira da Polícia Federal (PF) por suspeita de fraudes em contratos públicos que teriam desviado ao menos R$ 27,5 milhões de três prefeituras mineiras durante a pandemia de Covid-19, uma organização criminosa supostamente encabeçada pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS) teria usado a influência no meio político para tentar direcionar verbas federais a ao menos outros 18 municípios mineiros e, posteriormente, obter lucro por meio de contratações ilícitas, sem licitação. É o que aponta o relatório final da Operação “Entre Amigos II”, que indiciou 27 pessoas por suspeita de envolvimento no esquema criminoso contra a Prefeitura de Betim.
Apesar das fraudes contra pelo menos três prefeituras terem sido descobertas durante a crise sanitária, entre 2020 e 2021, a investigação – que é desdobramento de outra, em Divinópolis – encontrou indícios da tentativa de atuação da organização criminosa em outras 18 cidades desde 2018. Segundo o delegado Felipe Baeta, provas coletadas durante o inquérito demonstraram que os donos do IBDS contavam com auxílio de pessoas com experiência em gestão pública para atuar como lobistas em Brasília. A ideia era atrair recursos para prefeituras que estariam na mira da quadrilha entre 2018 e 2019.
“Eles tentaram direcionar verbas para essas prefeituras. São indivíduos que têm forte atuação política, mas atuam nos bastidores, de forma escusa, e mantêm contatos com políticos para indicar recursos e obter vantagem”, acusa o delegado. Ainda segundo Baeta, a PF tem evidências de que o IBDS iniciou a atuação nos municípios de “Matozinhos, Prudente de Morais, e Confins, mas depois conseguiu os contratos de Divinópolis, Betim e Ribeirão das Neves”. Nas três últimas cidades, foi comprovado rombo de pelo menos R$ 27,5 milhões, mas prejuízo pode chegar a 20% dos cerca de R$ 200 milhões pagos ao instituto para a gestão de serviços de saúde.
Segundo a investigação, um dos suspeitos de assumir o papel de articulador da organização criminosa seria Marcelo Luiz Alves, indiciado por peculato na “Operação Entre Amigos II”. Conforme o inquérito ao qual O TEMPO teve acesso, a PF recuperou uma série de ligações e mensagens trocadas entre ele e um assessor parlamentar que atuava em Brasília. Nas conversas, registradas entre 2018 e 2019, há pistas sobre o que seriam articulações feitas por Marcelo para tentar viabilizar a obtenção de recursos para a saúde em municípios onde o IBDS tentava emplacar contratos superfaturados para locação de ambulâncias. Não se confirmou, porém, se eles chegaram a obter êxito em todas as investidas.
Conforme o delegado Baeta, Marcelo teria profundo conhecimento sobre a administração pública por ter atuado em cargos de gestão em saúde em diversas prefeituras de Minas. Ainda de acordo com o chefe da operação, a experiência também permitiria ao suspeito trânsito fácil no meio político, o que favoreceria a atuação dele como lobista em favor do grupo criminoso. Em troca, a suspeita é que Marcelo seria um dos “amigos” favorecidos pelo grupo por meio de uma empresa de fachada contratada para fornecer produtos superfaturados. “Somente entre 2019 e 2020, uma fornecedora de máscaras descartáveis que estava em nome do Marcelo (Target) recebeu R$ 6,8 milhões em contratos com o IBDS para prestação de serviço para as prefeituras . Desse total, pelo menos 50% tenham sido desviados”, calcula o delegado. A reportagem não conseguiu localizar Marcelo e não teve êxito em contatar o IBDS após tentativa por telefone e por mensagem em rede social.
As fraudes supostamente lideradas pelo IBDS já provocaram 38 indiciamentos nas duas fases da “Operação Entre Amigos”. As investigações apontam desvio de recursos públicos contra Divinópolis, na região Centro-Oeste, e em Betim, na região metropolitana de BH. Segundo a Polícia Federal, o rombo ao erário desses municípios teria chegado a ao menos R$ 27,5 milhões e teria sido provocado por contratos firmados entre 2020 e 2021.
O esquema foi descoberto em Divinópolis, onde a PF descobriu que o IBDS teria contado com auxílio de servidores públicos para fraudar contratos para a gestão de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e de um hospital de campanha para atendimento a pacientes com Covid-19. Segundo a PF, o instituto superfaturava compras de materiais e direcionava contratos para empresas de fachada, que tinham como beneficiários pessoas envolvidas na fraude. Por lá, o prejuízo comprovado pela investigação foi de R$ 3,5 milhões.
Durante as investigações em Divinópolis, a PF descobriu que o esquema havia sido replicado em Betim, onde uma auditoria contratada pela prefeitura identificou o desvio de ao menos R$ 23 milhões em contratos para a gestão de equipamentos de saúde durante a emergência sanitária. “A participação da prefeitura nesse caso foi descartada”, ressaltou o delegado Felipe Baeta. Ainda segundo o chefe da operação, uma terceira fase da investigação também apura a atuação da organização criminosa em Ribeirão das Neves, onde ao menos R$ 1 milhão teria sido desviado pelo grupo.
Trocas de mensagens entre investigados citava articulações para tentarem se infiltrar em outros 18 municípios:
Belo Horizonte
Brumadinho
Caeté
Confins
Diamantina
Ibiá
Ibirité (Upa 24h)
Itambacuri
Guimarania
Matozinhos
Nova Lima
Pirapora
Pratinha
Prudente de Morais
Sete Lagoas
Taiobeiras
Tapira
Timóteo
Não se confirmou, porém, se eles chegaram a obter êxito em todas as investidas.