OPINIÃO

Proteínas vegetais e globais

O Brasil pode assumir um papel fundamental no planeta em crise

Por Vittorio Medioli

Publicado em 20 de abril de 2025 | 09:13

 
 
Plantação de soja Plantação de soja Foto: ALEXANDRE GUZANSHE/O TEMPO
Vittorio Medioli
Colunista de Opinião
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Empresários são aqueles que tocam negócios para auferir lucros. Tem um tipo mais comum que não se importa com como fazê-lo, apenas tem pressa. Adota o preceito maquiavélico: “Os fins justificam os meios”. Procura a via mais fácil para ganhar o máximo com o mínimo esforço e no menor tempo possível. E é aí que as atividades especulativas arregalam os olhos e abrem a gula de muitos. Se no rastro fica um déficit para o planeta, pouco importa.

Há também aqueles que, para ganhar, mesmo amparados pela legalidade, aproveitam-se de atividades imorais. Um exemplo é a produção de cigarros, uma praga da humanidade, ao par de bebidas alcoólicas, opioides e entorpecentes, que viciam e deturpam o ser humano.

Em escala menor, mas também extremamente nocivos, encontram-se nas prateleiras dos supermercados os alimentos processados de origem animal, contaminados pela crueldade contra seres vivos. São alimentos que devastam e poluem a natureza, exterminam espécies e diminuem a saúde do nosso planeta.

Nos últimos anos, empurrada pelas mudanças climáticas e por uma evolução da consciência dos homens, a preocupação com o aquecimento global provocado pelas emissões de carbono se instalou, com foco especialmente na geração de energia e, mais ainda, na mobilidade veicular.

Contudo, se o problema é a carbonização da atmosfera, ainda não se discute, como se fosse um tabu, a alimentação baseada em produtos de origem animal. A criação em larga escala de rebanhos que se destinam ao consumo está fora do debate mundial, apesar de ser responsável por 31% das emissões globais de carbono, contra 16% daquelas provenientes de mobilidade e transporte.

Esse foco na mobilidade, movido pela “consciência pesada”, acabou se direcionando ao setor automotivo, sem minimamente considerar o principal problema: a criação de animais. Isso resultou em uma crise devastadora no setor na Europa, com fechamento de fábricas e demissões em níveis nunca vistos anteriormente. Contudo, as emissões não diminuíram. Até porque a energia elétrica, em grande parte, depende ainda da queima de carvão e petróleo, fontes não renováveis.

O Brasil abriu, e agora está fechando, a importação indiscriminada de veículos elétricos, que, diga-se em letras maiúsculas, são mais poluentes do que os nossos movidos a etanol. 

A medida adotada é resultado da ignorância do nosso governo e da classe dominante. Foi precipitada. Desconhecem, e continuam a desconhecer, que o Brasil está utilizando, mais do que qualquer outro país, fontes sustentáveis e renováveis em proporção expressiva.

Poder-se-ia lançar um plano de descarbonização genuinamente brasileiro para erguer um modelo alternativo e de importância global. Não será a solução para substituir os 100 milhões de barris de petróleo consumidos diariamente no mundo, mas, se conseguir reduzir alguns milhões – até que o hidrogênio e outras fontes de energias neutras se difundam nas próximas décadas –, já será uma contribuição fundamental para mostrar soluções e compartilhá-las com o mundo. Outros países também poderão tirar proveito.

O Brasil tem ainda a obrigação de aumentar a produção de fontes renováveis, como etanol e biodiesel, e de consumi-las internamente, gerando empregos e sequestros de poluentes e mostrando que não há perda de alimentos.

Temos também como reflorestar milhões de hectares de áreas degradadas – o que precisaria de incentivo oficial – e, com isso, sequestrar carbono em larga e expressiva escala. O Brasil, e isto depende de sua própria vontade, pode assumir, sem perder tempo, um papel fundamental no planeta em crise. Infelizmente, faltam-lhe consciência e singela vontade.

Os produtos que resultam dos processos de industrialização da cana, do milho, da soja, do sorgo, da canola e do girassol geram, além de combustíveis, alimentos vegetais de alto valor proteico. A fermentação desencadeada nesses processos dá origem a leveduras que produzem proteínas, com a vantagem de não conter as toxinas das congêneres contidas nas carnes.

Infelizmente, temos um governo refém de uma mentalidade singela e superada, que não sabe que está sentado nas melhores soluções sustentáveis. Não são exploradas as vantagens caseiras, tampouco as vantagens de um programa em escala mundial de exportação de proteínas vegetais, aquelas que inevitavelmente a humanidade deverá consumir para salvar o planeta.

O nosso problema não é externo: é o desconhecimento científico e a carência moral que nos fazem perder o bonde para continuar andando descalços e com os pés sangrando.